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Lições de MaquiavelJorgeaziz13@gmail.com
Antes de ser um problema de eficácia, o problema
político do Príncipe é um problema de tempo: conseguir manter a duração
de um estado de coisas constitucionalmente provisório, móvel e frágil.
A constituição de um Estado responde a esse problema de
tempo: a letra maiúscula que o diferencia de outros estados significa
apenas que se trata de um estado que recebeu o privilégio de durar, pois
o estado natural do que existe esta desprovido de todas as
características de um estado; estado - implica um mínimo de
estabilidade e duração – o que existe é um tecido de circunstâncias que
escapa a qualquer controle e não assegura, per si, nenhum princípio de
permanência, logo, “é difícil estabelecer as regras gerais concernentes a
um objeto que varia segundo as circunstâncias”. (Maquiavel) Isto resume
todo o problema político de transformar o circunstancial e regular.
E aqui, o problema do tempo está no centro do problema
político, portanto, toda arte do Príncipe, para Maquiavel, consiste em
apropriar-se do tempo (para fazê-lo durar) e em conseguir que seus
súditos não o tenham a fim de evitar que esses disponham de uma duração
utilizável contra o Príncipe.
“A razão disso acrescenta
Maquiavel, é que a amizade sendo um simples vínculo moral de
reconhecimento, não se consegue manter diante dos ataques do interesse,
ao passo que o medo tem por base um castigo cuja idéia permanece sempre
viva”.
Independente de qualquer análise de valor é um
critério de duração que serve para resolver o problema da utilidade
comparativa dos “castigos” e “benefícios” (ônus e bônus da atividade do
Príncipe), assim como serve para resolver todos os problemas da
eficácia. Do mesmo modo, a sabedoria política consiste em reduzir o
tempo da “crueldade” e manter a duração o máximo possível, do tempo dos
“benefícios”.
Afirma Maquiavel, “é preciso que o
usurpador de um Estado cometa de uma só vez, todas as crueldades (aquilo
que se tornam ônus) de que necessita para sua segurança a fim de não
ter que repeti-las; não as cometendo novamente é que se assenhora de
seus novos súditos e depois os seduz com benefícios. Essas ofensas devem
ser feitas numa só vez, de modo que, sentidas por menos tempo, firam
menos, porém os benefícios devem ser concedidos lenta e gradualmente, de
modo que sejam melhor saboreados”.
O controle do
tempo, o domínio político, significa criar duração em seu próprio
benefício, privando dela os seus súditos. A intuição dessa filosofia
política de Maquiavel é que nada é capaz de mudar por suas próprias
forças ou por sua própria natureza. Não há nada eu dure por si, porque
não existe nenhuma natureza: natureza designa uma organização
transcendental ao jogo dos costumes e das circunstâncias, assegurado
assim uma relativa permanência ( estabilidade) no âmago das vicissitudes
históricas.
“O caráter do povo é mutável, conduzimo-los
facilmente para uma opinião, porém é difícil mantê-los nela” Maquiavel
para o Príncipe.
De maneira geral, idéia de que uma dada
situação possa manter-se, por si só, é a grande ilusão contra o qual
Maquiavel adverte o Príncipe. Essa ilusão autoriza a timidez – pois
dispensa o Príncipe de tomar partido e de intervir antes que seja tarde
demais para agir com eficácia – impedindo o Príncipe de dominar uma
situação cujo controle, para ser eficaz, deve constantemente ser
renovado. A idéia de uma permanência natural é a própria definição do
erro político e a fonte da ruína do Príncipe.
Uma
situação favorável só será mantida se, constantemente e artificialmente,
sofrer a ação de sua política. O único problema político é durar, ainda
que nada esteja sujeito a durar. É manter a própria potência, ainda que
o objeto subjugado seja incapaz de se manter e incessantemente se
modifique.
Por outro lado, o problema da duração explica a
inutilidade da moral no pensamento de Maquiavel. Um grande intervalo de
tempo separa a intuição do ato, e o ato de suas conseqüências.
Portanto, não se pode levar em consideração, como fazem os moralistas,
os princípios em nome dois quais os homens pretendem ter agido (é
duvidoso que uma intenção “dure” até o ato e suas conseqüências).
O importante é o resultado, não a intenção moral que pode
preceder-lhe, ou os meios pelos quais esse resultado foi alcançado. É ao
resultado que se pedirá explicação sobre as intenções e os meios,
definitivamente, tudo o que lhe exige é conseguir durar. Por isso, o
grande inimigo do Príncipe é o tempo: o tempo, mau “condutor” da
duração, incapaz de garantir a permanência das circunstâncias. A duração
não é impossível, porém deve ser fabricada.
Fabricar a
duração revela-se como a tarefa específica da política, por definição
tarefa violenta. Eis o cargo e função da violência maquiavélica:
violência com um tempo que, se não se deixasse forçar, permaneceria
incapaz de produzir/fabricar duração (dura ação). Violência com um
mundo não-natural que, sem a intervenção política, permaneceria incapaz
de produzir natureza. Ou seja, como fazer o tempo perdurar, como criar o
natural prolongando artificialmente o acidental ou, como obter da
circunstância a substância de uma natureza. Eis toda a problemática
política de Maquiavel, cuja resposta é pela força. A palavra força deve
ser entendida em todos os sentidos, isto é, no sentido da violência
armada e no sentido de criação de artifício, expresso no verbo “forçar”.
Para Maquiavel, fazer política é forçar a mutável natureza
do homem ( ou melhor, sua ausência de natureza) para obter forçosamente –
uma natureza relativamente permanente: fazer do homem um ser costumeiro
(um conjunto de costumes provisoriamente permanentes). E por esta
razão, só existe política violenta, intervencionista. Isto que o designa
como uma política. Injeta artifício para forçar o que existe a produzir
duração e natureza. Uma mudança (política ou religiosa) só tem
oportunidade de duração se puder “forçar”. Daí a razão porque todos os
profetas armados puderam triunfar e os desarmados sucumbir.
O príncipe de Maquiavel poderia e deveria ser estudado como uma
ilustração histórica do “mito” soreliano, isto é, de uma ideologia
política que não se apresenta como uma fria utopia ou uma argumentação
doutrinária, mas como a criação de uma imaginação concreta que intervém
em um povo dispersado e pulverizado para então, suscitar e organizar uma
vontade coletiva.
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