LAGOA DE MONTANHAS

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quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

LANÇADA BIOGRAFIA DE D PEDRO II




Foi lançada  essa semana a biografia do imperador D. Pedro II, intitulada Imperador Cidadão, de Roderick J. Barman, Editora Unesp, 624 páginas, R$75,00. Uma boa biografia, nem tanto pela qualidade do texto, mas pela qualidade das informações. Talvez porque o autor seja um brasilianista (estrangeiros que estudam o Brasil) e, ao ter seu texto vertido para o português, não tenha sido abençoado com um bom estilo, uma boa escrita. Mas digo logo de cara que, se você é daquelas pessoas que querem compreender o Brasil atual, precisa ler este livro (e alguns outros, claro, como Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Hollanda ou Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freire, apenas para citar os mais famosos).

Roderick J. Barman é um historiador britânico radicado no Canadá e autor do livro Princesa Isabel do Brasil, Editora Unesp, 352 páginas, R$41,00. Talvez seja interessante ler este livro também depois, porque a imagem da Princesa Isabel na biografia no Imperador não é das melhores. Ela aparece como uma mulher apática, religiosa e bastante inábil com as artes do poder.
DivulgaçãoBiografia do Imperador D.Pedro II 
 
 
Biografia do Imperador D.Pedro II

O que mais me chamou a atenção na biografia do Imperador foi a quase total falta de graça de sua vida cotidiana, enquanto ele dirigia um império de dimensões continentais, com eventos cruciais para a formação do Brasil moderno: a Guerra do Paraguai e a Abolição dos Escravos. Ele foi um homem paradoxal, que era ao mesmo tempo extremamente conservador, centralizador e também um progressista. Sonhava com um Brasil todo interligado por ferrovias, com altos índices de educação e indústria. Mas também dava rédeas soltas para a elite monocultora nacional, notadamente a monocultura do café.

Sua prática cotidiana no poder não diferia muito de um ditador nos moldes atuais. Todos os assuntos tinham que passar por sua apreciação e aprovação. Essa centralização do poder e a proteção às elites pode ser a origem de muitas mazelas que ainda infernizam o país. A cultura da corrupção, do clientelismo e da burocracia se consolidou em seu reinado, desde que seu avô D. João VI botou os pés num cais do Rio de Janeiro. Daí a necessidade de lembrar também os livros fundamentais de Laurentino Gomes, 1808 e 1822.  

A Guerra do Paraguai, um empreendimento bélico que foi a menina dos olhos do Imperador, gerou um militarismo que iria perdurar até os nossos dias, de forma bastante nefasta. A escravidão, que o Imperador deixou se estender muito além do necessário deixou para nós um país com um racismo hipócrita e uma multidão de cidadãos de segunda classe, sem acesso aos bens comuns. O fim da escravidão, ao invés de causar uma quebradeira nas elites agrícolas, gerou um novo tipo de escravidão, baseada nos salários infames.

Tudo isso é uma herança deixada por este Imperador carismático, bondoso, frio, desprendido. Talvez, se os republicanos o tivessem deixado morrer no poder, fazendo uma transição sem traumas, o Brasil fosse outro. Essa é uma das teses do livro. Ele não conseguiria passar a coroa para sua filha inábil.

Por isso voltei a me interessar por um livro, que esteve comigo duas vezes, e eu passei à frente porque achei que não ia ler. Estou falando de Ordem e Progresso, de Gilberto Freire, que passa a ser agora meu próximo objetivo de leitura. Neste livro o sociólogo pernambucano se debruça no período logo após a derrubada de D. Pedro II do poder e a chegada dos republicanos.

Outra coisa que prende muito a atenção do leitor neste livro é  a trajetória do Imperador, um homem muito ligado às letras, às artes e às ciências. Um iluminista fora de época, por assim dizer. Este homem pouco ligado à liturgia de seu cargo, extremamente honesto, morreu no exílio à beira da pobreza. E aí vemos outra faceta da elite política brasileira. Ao mandar embora seu Imperador, os republicanos tiraram todas as condições de vida do homem. Ele só conseguiu sobreviver quando vendeu seu espólio no Brasil. Mas aí, você vai ter que ler o livro para saber os detalhes.

Vamos ver o que diz a sinopse do livro: "Quem foi o homem e o imperador D. Pedro II? Que anseios e frustrações escondiam-se por trás da aparência impassível e ascética do monarca, que assumiu o trono aos 14 anos? Que impacto teve a partida de D. Pedro I para Portugal sobre o herdeiro do Império, então com apenas seis anos e já órfão de mãe? Como ele enfrentou o exílio e morreu pouco tempo depois de deixar o Brasil em 1889? Qual foi o legado de seu longo governo?"

Munido de vasta documentação, o historiador Roderick Barman reconta neste livro a vida do último imperador do Brasil e não poupa detalhes, nem mesmo os mais íntimos, que mostra um homem que casou por encomenda, profundamente apaixonado por outras mulheres e extremamente frio com a esposa. O grande mérito do livro é mostrar que D. Pedro II é o verdadeiro criador do Brasil como estado-nação.

"Para enfatizar a capacidade de administração e liderança de D. Pedro II, o livro reconstrói o cenário social e político do Brasil à época em que ele assumiu o poder, em 1841, quando mal havia chegado à adolescência. Era um país intensamente instável, constituído por dezenove províncias, unidas apenas pelo idioma e por um governo autocrático, que havia conquistado a independência política e se estabelecido como Estado único havia apenas cerca de duas décadas".

Quando o Imperador deixou o Brasil, 48 anos depois, outro país havia emergido. Roderick Barman acha que grande parte das realizações e limitações de D. Pedro II foram esquecidas pelos brasileiros e eu também acho isso. Basta olhar o fenômeno do messianismo inaugurado por Lula da Silva, o chamado "lulismo". Para mim nada mais é que essa herança deixada pelo carismático Imperador. O Brasil ainda está órfão desse velho, assim como encontrou outro messias em Getúlio Vargas (e aí nunca é demais lembrar a trilogia sobre o período que o escritor Lira Neto vem fazendo com brilhantismo) e ficou órfão de novo.

Se você fica pasmo com o rio de lama que corre em Brasília, e que somos obrigados a ver todos os dias nos telejornais, como eu fico. Então, só podemos entender esse fenômeno procurando explicações em nossas origens. O Brasil é um país gigantesco, multicultural e complexo. Ninguém quer que seja um país perfeito, mas que pelo menos reduza um pouco essas discrepâncias, esse abismo de classes. Que pelo menos corruptos sejam punidos, que haja ética na política e na vida das pessoas. Menos ganância e mais beleza. Menos crime e mais virtude.

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