ta: 19 fevereiro 2013 - Hora: 18:47 - Por: Conrado Carlos
“Atenção a todos!!! Quando usar o banheiro, jogue um balde d’água nas
fezes! Dessa maneira, evitamos a bagunça que os ratos fazem com sua
m…!”. O aviso exclamativo e escatológico está fixado acima de mictório
de um dos três banheiros que ainda funcionam na Casa do Estudante de
Natal. O prédio histórico, construído em 1856 e transformado em
hospedaria para jovens oriundos do interior do Estado 90 anos depois,
vive um processo de degradação que parece inacabável. Da calçada é
perceptível o cheiro de dejetos humanos, animais, alimentos estragados e
mofo, que deixa o lugar com ares de presídio.
Na manhã desta terça-feira (19), a reportagem esteve no local e
constatou a fedentina que, aliada aos forros e rebocos corroídos,
oferecem uma imagem condizente com um ponto de encontro para viciados em
drogas, ao contrário do motivo maior: oferecer apoio logístico para a
parte mais pobre da juventude potiguar. Água suja e urina no chão, teto
com manchas verdes de infiltração, mosquitos, gatos, pichações compõem o
cenário de um salão que um dia serviu de lugar para leitura. No pátio
central, alunos e desocupados assistem televisão em meio às moscas.
A situação é a pior dos últimos anos, segundo os residentes. O que
outrora fora um refeitório, agora é um galpão abandonado com janelas
quebradas, sujeira onipresente e o fantasma do que um dia serviu de
moradia para norte-riograndenses ilustres. Nos quartos, fios expostos e
paredes descascadas. O perigo e a falência moral aparecem em cada cômodo
(51 ao todo). Mesmo assim, o tom das reclamações é ameno. “Na minha
cidade, todos que têm alguma coisa, passaram por aqui”, diz Marco
Antonio, de 22 anos, que há quatro trocou Pilões, no Alto Oeste, pela
Casa do Estudante.
Em pleno recesso estudantil, durante o mês de janeiro, a Casa foi
invadida por marginais que arrombaram dois quartos. “Antes, professores
bons vinham dar aula de graça, como um reforço, aqui pra nós. Agora não
vem mais ninguém, pela situação que isso está aqui. Antes funcionava
tudo”, diz Marco Antonio, aluno de um cursinho pré-vestibular. Ao custo
de R$ 20 por mês, ele e mais 180 estudantes têm a disposição água
encanada, energia, telefone e alimentação.
Para Deividem Lisboa, jovem natural de Pau dos Ferros que trancou a
faculdade de Direito, a vulnerabilidade começa com a alvorada: “Aqui de
dia não tem vigia e à noite só tem um sargento aposentado da PM. Eu
quero ficar só mais um ano, no máximo. Não tem condições de viver nessa
imundície toda” – como apoio às cinco instituições de direito privado
que abrigam estudantes no Estado, a Secretaria do Trabalho, da Habitação
e da Assistência Social (Sethas) faz um repasse de R$ 150 mil.
A administração da Casa do Estudante está sob responsabilidade do
ex-cozinheiro Luiz Alves. Há 28 anos, ele convive com grupos de jovens.
“O quarto depende de cada um. Todo mundo é de maior (sic). Só que ali,
tem muitos que não são estudantes, são elementos que não estudam, mas
não saem da Casa. Eu não posso pegar na mão deles e botar pra fora”.
Ciente da cena dantesca, ele diz que está em fase de regularização dos
documentos da instituição para solicitar melhorias para o prédio.
Do outro lado da mesa de negociações, à espera de Luiz Alves, está o
secretário Luiz Eduardo Carneiro Costa. “Não gerimos a Casa do
Estudante. Damos um apoio pagando as contas básicas. Desde o ano
passado, estamos esperando essa documentação. Mas até agora, nada. Não
podemos fazer tudo por eles. A ideia é que eles procurem parceiros, e
nós somos parceiros. Estamos aqui para ajudar. Cheguei a falar com a
Fundação Banco do Brasil, mas eles [a administração da Casa] não
retornaram até agora, mesmo eu oferecendo a estrutura da secretaria para
ajudá-los na elaboração dos projetos”.
No meio do imbróglio, o prédio histórico tem o emblema da negligência
em duas placas, uma inaugurada pelo então governador Vivaldo Costa, em
1994, e outra na gestão Cortez Pereira, em 1973. Fé e desenvolvimento
são mesclados em textos fora da realidade observada e mantida pelos
últimos governos. A primeira diz que [...] aos estudantes que vivem
nesta casa a esperança de um futuro melhor para o nosso Estado”.
Enquanto a segunda, traz entre outros dizeres “[...] que Deus nos ajude a
nós, Rio Grande do Norte, Povo e Governo, para sermos, na nossa
dimensão, a dimensão grande que é o Brasil”.
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